quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

O futuro na Antártica Há muito mais do que apenas gelo sob a superfície fria da Antártica.

A região é peça fundamental para o homem entender seu passado e acompanhar os efeitos que nortearão o amanhã
Élcio Braga
Rio - O homem está mais perto de conhecer o passado e prever o futuro da Antártica. A descoberta de lagos aprisionados entre a terra e a camada de gelo excita os cientistas. O mais famoso e maior está sob a estação russa Vostok, a 3.780 metros abaixo da camada de gelo. Possui 14 mil km². O lago está isolado há mais de 15 milhões de anos, quando começou a ser recoberto pelo gelo. Cientistas especulam sobre que microorganismos podem ter evoluído ali.Pesquisadores furam o gelo até o lago. Há expectativas de que cheguem ao líquido em março. Mas terão de ter cuidado para não contaminá-lo com organismos externos. A Antártica é um mundo a ser descoberto e preservado. Desde domingo O DIA mostra como o Brasil contribui nessa missão ao completar 25 anos da Estação Comandante Ferraz.O esforço coletivo de cientistas desvenda a fantástica História do lugar mais inóspito da Terra. Há 180 milhões de anos, a Antártica fazia parte do supercontinente Gondwana, que englobava a América do Sul, a África, a Índia e a Austrália. Depois de se desprender, a região — coberta por floresta e fauna parecidas com as do Brasil à época — começou a ganhar geleiras há 25 milhões de anos. No futuro, ela se unirá à Austrália.O Brasil liberava R$ 10 milhões anuais ao Proantar até 2007. Com apoio da frente parlamentar, quase dobrou a verba. A partir de março, lançará novo navio, o Almirante Maximiliano. O Ary Rongel, o único em atividade, oferecerá mais apoio logístico. O conhecimento sobre a Antártica permite preservá-la melhor. No praia onde o Brasil se instalou, há alerta sobre os riscos de degradação do ambiente. O explorador francês Jacques Cousteau montou, na década de 80, esqueleto de baleia que denunciava a caça e os riscos de extinção de algumas espécies. O monumento virou símbolo.A caça está proibida por convenção. Mas, sob alegação de fins científicos, barcos japoneses ainda agem no Oceano Antártico. O Greenpeace protesta no Japão. Outra ONG, a Sea Shepherd, tenta afundar baleeiros.A luta pela preservação da Antártica ganha terreno. O interesse é cada vez maior. Mil pesquisadores no inverno e mais de 4 mil no verão desenvolvem pesquisas em vários campos do conhecimento.O interesse se reflete também no turismo. Este ano, mesmo com a crise, mais de 40 mil turistas devem visitar a Antártica. Os pacotes vão de 5 mil dólares a 30 mil dólares. Há quatro anos, 15 brasileiros foram lá. “Este ano vendemos 100 pacotes”, conta Zelfa Silva, representante de operadoras de turismo. A empresária, que já visitou o mundo todo, elege a Antártica como o lugar que mais a impressionou: “Ela nos faz sentir pequenos”.‘A PARTICIPAÇÃO DA ANTÁRTICA NA ELEVAÇÃO DO MAR SERÁ PEQUENA’: ENTREVISTA DE Jefferson Cardia Simões, glaciologistaO professor Jefferson Cardia Simões está acampado em barracas no continente antártico à frente de grupo de cientistas. Ele perfura o gelo para conhecer a composição da atmosfera (registrada na neve) nos séculos em que começou a industrialização. A primeira expedição nacional ao continente branco custou em torno de 400 mil dólares. Por telefone via-satélite, deu a seguinte entrevista a O DIA:Há evidências de que a Antártica está derretendo?Hoje temos certeza de que isto nunca ocorreu nos últimos 25 milhões de anos. É claro que mudanças climáticas sempre ocorreram e vão ocorrer. O homem estámudando a química da atmosfera. Por isso estamos estudando. Como mudanças no clima afetam a Antártica?O interior da Antártica é muito estável. Estamos tendo efeito de mudanças aceleradas, notadamente na região onde o Brasil trabalha, na península e arredores. O derretimento dessa região elevará o nível do mar?Nesta área mais quente da Antártica, as geleiras estão derretendo muito rapidamente, inclusive com o colapso das plataformas de gelo. Mas quem está contribuindo para o aumento do nível do mar, principalmente, é a Groelândia e os Andes. Nossa previsão é que o mar se eleve até 60 centímetros em 2100. A contribuição da Antártica nesses 60 cm é de apenas 6 cm.A região mais afetada, então, é pequena em relação à área total?A Antártica é muito fria. Existe gelo quente e gelo frio. Nas geleiras perto de Ferraz, tem gelo a -1 grau. Aqui, onde trabalho, o gelo está a -33 graus. As pessoas confundem a história de que as calotas polares estão derretendo. Isso é tema até arcaico. A região de Ferraz perdeu 7% da cobertura de gelo em 40 anos. Geleiras ali encolheram três quilômetros. Mas a Ilha Rei George é do tamanho da cidade do São Paulo. A Antártica é quase do tamanho da América do Sul.O senhor já participou como palestrante em cruzeiro na Antártica. O turismo é um risco?Acho o turismo importante para se divulgar o ambiente antártico. Mas está atingindo o limite de visitantes. Defendo algum controle.